Criança e Adolescente

01/04/2016

INTERNET - Comissão aprova projeto para criminalizar o incentivo à automutilação

Crescimento de grupos em redes sociais ligados ao cutting estimulou a mudança na legislação brasileira.

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Atualmente o Código Penal não classifica o crime de estímulo à automutilação.
(Foto: Greg/DP)

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Aproximadamente dez mil resultados é o que o YouTube, site de hospedagem de vídeos, apresenta quando é feita uma pesquisa pela palavra "automutilação". No instagram, a busca pela tag #cutting - termo também utilizado para designar a prática de lesões ao próprio corpo - gera um resultado de mais de quatro milhões de posts. O Tumblr, rede social que se assemelha ao formato de blog, possui milhares de perfis totalmente dedicados ao tema: são publicados desabafos, imagens das lesões, mensagens sobre depressão e outros transtornos. O Twitter também não fica para trás, basta pesquisar. Já no Google, são 470 milhões de publicações relacionadas ao termo cutting.

O crescimento do número de grupos em redes sociais relacionados à prática de automutilação tem gerado preocupação. A falta de informação deixa os responsáveis por crianças e adolescentes aflitos, enquanto os praticantes do cutting buscam chamar atenção para um problema sério e que precisa de visibilidade. O debate em torno do tema motivou a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado a aprovar, no fim de fevereiro, um projeto que pretende alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). De autoria do senador Ciro Nogueira (PP), a proposição pretende criminalizar o induzimento, instigação ou auxílio à automutilação de criança ou adolescente.

A redação do Diario identificou grupos de praticantes de cutting na rede social Facebook. As comunidades têm caráter de apoio e existem como um suporte a quem busca curar a dependência. Tanto a psicologia quanto a psiquiatria consideram como benéfica a existência dessas associações, semelhante ao que acontece em grupos terapêuticos como o Alcoólicos Anônimos. A administradora de uma das páginas de apoio hospedadas no site, informou que reúne pessoas entre 13 e 19 anos que buscam ajuda. "Se eu estou me esforçando tanto a não ceder aos desejos e vejo imagens (das lesões), depoimentos e qualquer outro meio favorecendo, com toda certeza vou acabar cedendo", diz ela, que prefere a publicação de mensagens otimistas. "É interessante darem atenção a essa causa que antes era muito pouco conhecida", completa.

Segundo o senador Ciro Nogueira, para fazer parte dos grupos é preciso "lesionar o próprio corpo e divulgar o resultado por meio de fotos ou vídeos". O parlamentar informou que não existem ainda dados oficiais sobre a prática no Brasil, nem uma lista específica de identificação de grupos, mas que é "muito fácil" encontrar nas redes sociais inúmeros grupos que incentivam e estimulam a prática entre jovens.

De acordo com o psicólogo e professor de Teorias Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Sylvio Ferrer, automutilação ou cutting são danos causados ao corpo através de escoriações provocadas pelos mais diversos instrumentos, por pessoas que têm algum transtorno psíquico ou angústia. É uma maneira, segundo ele, de transferir a dor emocional para a dor física. Ele defende, ainda, que o induzimento somente surtirá efeito em pessoas que já estejam vulneráveis. Já o especialista em neuropsiquiatria Everton Botelho Sougey explica que existem estudos que apontam ausência de endorfina no organismo dos praticantes de automutilação. As lesões, portanto, estimulam a produção da substância, promovendo alívio e calma, o que gera uma espécie de vício.

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Automutilação não é crime no Brasil

Atualmente o Código Penal não classifica o crime de estímulo à automutilação. O artigo 122, Decreto Lei 2848/40, trata apenas do induzimento, instigamento ou auxílio ao suicídio, submetendo o réu a aumento de pena no caso de a vítima ser menor de idade. Segundo o juiz da Primeira Vara dos Crimes contra Criança e Adolescente do Recife, José Renato Bizerra, o instigamento à automutilação, hoje, pode ficar no âmbito da lesão corporal ou do induzimento ao suicídio, com pena de até 12 anos.

Ainda segundo o juiz, o enquadramento legal do incentivo ou auxílio à automutilação só pode ser feito caso a caso, já que envolve liberdade individual. "Só um caso concreto pode ter um julgamento mais justo, porque é delicado e envolve outros setores, como a psiquiatria e a psicologia", afirma.

O projeto do senador não determina o que seria classificado como indução ao cutting. O parlamentar explica que a ideia do projeto não é definir na lei o que é incentivo à automutilação, mas criar meios para punir esse tipo de violência. O crime, segundo ele, pode ser provado através de print screen (captura de tela), gravação de e-mail, impressão em papel e solicitação, aos sites e redes sociais, de registros de conversas e publicações.

A matéria agora segue para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde recebe decisão terminativa. Se aprovada, segue para análise na Câmara dos Deputados, a menos que seja aceito recurso para que a decisão final no Senado seja em Plenário.

Mariah Villanova
Especial para o Diario

[Fonte: Diario de Pernambuco - 29/03/2016]

 

CDH aprova punição para quem incentiva automutilação de crianças

 

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(Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

Proposição Legislativa
Projeto de Lei do Senado nº 664/2015
Ementa: Inclui o art. 244-C na Lei nº 8.069/1990, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, para tipificar o crime de induzimento, instigação ou auxílio à automutilação de criança ou adolescente.

Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa
Parecer aprovado na comissão CDH – 24/02/2016

A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) aprovou projeto que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para tipificar o crime de induzimento, instigação ou auxílio à automutilação de criança ou adolescente. Uma emenda incorporada ao texto determina pena de um a dois anos de reclusão para o caso de a lesão corporal se consumar.

Ainda nos termos da emenda, se o ato resultar em lesão corporal grave à vítima, a pena será de um a três anos de reclusão. Em caso de morte, o condenado pelo crime responderá com penas de dois a seis anos de reclusão.

O autor da proposta, senador Ciro Nogueira (PP-PI), ressalta o crescimento do número de grupos, nas redes sociais, que incentivam e estimulam a prática da automutilação entre crianças e adolescentes. Para serem aceitos, esses jovens precisam lesionar o próprio corpo e divulgar o resultado por meio de fotos ou vídeos. Para o senador, a criminalização dessa prática desestimulará o surgimento dos grupos.

Nos termos da proposta, será punido com prisão quem induzir ou instigar criança ou adolescente a ofender a sua integridade corporal ou a sua saúde, ou prestar auxílio para que o faça, inclusive por meio de salas de bate-papo na internet. A pena será aumentada se do crime resultar lesão corporal ou morte.

Para a senadora Ana Amélia (PP-RS), o texto inova no campo penal porque a atual legislação somente trata da penalização ao induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio e ao incitamento ao crime.

A matéria segue agora para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde receberá decisão terminativa. Desse modo, se aprovada, a matéria deverá seguir diretamente para análise na Câmara dos Deputados, a menos que seja aceito recurso para que a decisão final no Senado seja em Plenário.

Da Redação

[Fonte: Agência Senado - Senado Federal - 24/02/2016]

 

Adolescentes exibem automutilação nas redes sociais

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Adolescentes compartilham no Instagram fotos de automutilação

O fenômeno conhecido como cutting - uma prática de automutilação que consiste em fazer pequenos cortes no corpo - está ganhando uma perigosa popularidade graças às redes sociais. É o que diz a psiquiatra Jackeline Giusti, do Ambulatório de Adolescentes, Drogas e Automutilação do Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Segundo a pesquisadora, embora não existam registros oficiais sobre esse comportamento no Brasil, basta uma consulta em redes como Youtube, Instagram e Facebook para constatar o aumento do interesse pelo tema. Foi o que Jackeline fez em 2012. Ao buscar a palavra "automutilação" no Youtube, ela encontrou 141 vídeos postados somente naquele ano. A mesma pesquisa feita em outubro de 2015 revelou 2.430 novas postagens ao longo do ano. São vídeos feitos, em sua maioria, por meninas contando suas histórias ou expondo suas cicatrizes.

Dor no corpo ameniza a dor na alma

Muitos automutiladores relatam alívio com a prática. "É como se infligir dores no corpo aliviasse as dores da alma", declara a psicóloga Eliana Olímpio, especialista em adolescência pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais. "Porém, imediatamente após o alívio, a pessoa sente culpa e medo. Sentimentos que fazem com que o adolescente se isole e se sinta sozinho."

Em tempos de relacionamentos virtuais, as redes sociais constituem uma tentativa de romper esse isolamento e buscar ajuda. "Vivemos em um momento social em que o que não é visto, não é sentido, e o que não é compartilhado, perde o valor de vivido. A automutilação, longe de ser uma moda, é um sintoma do nosso tempo, de como os adolescentes vivenciam os acontecimentos e onde e como estão encontrando formas de expor suas dores subjetivas. No corpo e na internet, o subjetivo se torna real", diz a psicóloga Mariana de Oliveira, especialista em psicodrama clínico e sócio educacional.

A paulistana Giulia*, 17, é uma dessas jovens que usa as redes sociais para compartilhar suas dores. Ela começou a se cortar quando perdeu a avó, por quem havia sido criada. Teve de morar com a mãe, usuária de drogas. Tinha, então, 12 anos. Já tentou parar de ferir os braços com facas e lâminas de barbear, mas acabou voltando. "É mais forte do que eu", fala.

"A prática torna-se um vício. A pessoa se corta mais e mais e, mesmo sabendo dos danos que podem acontecer, não consegue parar", afirma Eliana. Segundo a psicóloga, a vítima só se livra do vício se assistida por um profissional que oriente um processo de libertação dos sentimentos (muitas vezes inconscientes) que a levam à automutilação.

Sinais e o que fazer para ajudar

Um dos sinais mais característicos da prática de cutting é o uso de roupas compridas, como as que usa Tânia*, 13. Ela mora em Rio das Ostras, cidade litorânea do Rio de Janeiro, e nunca tira as camisas e as calças compridas, mesmo nos dias de maior calor, para esconder as cicatrizes. "Geralmente os cortes são feitos em locais mais fáceis de serem cobertos, como braços, pernas e abdome. Não é o objetivo da automutilação exibir os ferimentos no dia a dia; se o fazem, geralmente, é de forma anônima", diz Jackeline.

Mas há ainda outros sinais que devem despertar a atenção dos pais: adolescentes que apresentam mudanças bruscas de humor, hábitos ou horários podem estar com problemas. "É importante que os adultos aprendam a conhecer seus filhos. Estar junto deles nos diversos eventos e situações que eles vivenciam favorece esse conhecimento. Não é para investigá-los, mas para servir como ponto de apoio. O diálogo em todas as circunstâncias é a melhor precaução", afirma Eliana.

Um tratamento especializado, com psiquiatra ou psicólogo –de preferência, para toda a família– torna-se necessário quando o distúrbio já está instalado. No caso da carioca Vitória*, 13, a ajuda demorou a chegar: ela começou a se cortar com apenas sete anos, depois de conhecer a prática na internet. Diz que começou a fazer isso para amenizar a dor pelo bullying que sofria na escola: "Falavam que eu era gorda, burra e que podia sumir", afirma. Ela conta que se corta com cacos de copos quebrados, que guarda em uma caixa. Há mais ou menos um ano, a mãe descobriu o problema e a levou a um psicólogo. Mas Vitória ainda não conseguiu parar de se cortar.

"Se um pai ou mãe descobrir sobre a automutilação do filho, em um primeiro momento, o ideal é agir simplesmente como se ele estivesse chorando", diz Jackeline. Ou seja, o acolhimento amoroso dever ser a primeira reação. "É importante perguntar o que o faz sofrer e não diretamente sobre a automutilação. Depois, pais e filhos devem buscar juntos a ajuda de um profissional", afirma a psiquiatra.

* Nomes foram alterados para preservar a identidade das entrevistadas.

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Do UOL, em São Paulo

[Fonte: UOL Mulher – Gravidez e Filhos – 15/01/2016]

 

Download:   (arquivos PDF)
»  Parecer aprovado na comissão CDH - 24/02/2016

Referências:   (links externos)
»  Agência Senado
»  Diario de Pernambuco
»  UOL - Mulher

 

 

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